Juliano Dutra costuma citar uma frase do professor e diretor José Henrique Moreira, que resume seu foco: “Todos gostam de ópera… alguns não o sabem ainda”. O maestro destaca um dos objetivos do projeto Sinos é ir ao encontro da população e dos profissionais da música, para difusão da prática operística. Nesta entrevista, Juliano nos fala sobre sua formação, carreira e, claro, se seu gênero musical preferido.
**Como começou sua carreira na música e como escolheu a ópera?**
Meu primeiro contato com a música foi através de um projeto social, criado para famílias de baixa renda, na zona norte do Rio de Janeiro. Onde morava, o acesso à música de concerto não era fácil e, somente aos 18 anos de idade. pude assistir uma orquestra sinfônica pela primeira vez. Foi uma experiência que mudou a minha vida: naquele momento, decidi que seria um maestro e comecei a estudar regência. De lá até a profissionalização, foi um longo caminho e a Escola de Música da UFRJ teve papel fundamental nessa jornada. Foi na UFRJ que tive meu primeiro contato com o repertório operístico, e onde assinei a direção musical da minha primeira ópera, *Il Segreto di Susanna*, de Wolf-Ferrari. Me encantei pelo gênero!
A mistura do drama e música, em todas as suas formas, tem um espaço enorme no meu coração. Desde então, tive oportunidade de atuar em 11 produções diferentes, e neste ano assino a regência e direção musical de meu décimo segundo título, o segundo em território Americano.
**Você sempre atuou em óperas ou teve interesse em outros estilos?**
Quando comecei os estudos de regência, minha atuação e foco de estudo eram majoritariamente em música sinfônica. A ópera parecia algo distante em um primeiro momento. Quando tive contato real com o gênero, trabalhando, ensaiando, minha perspectiva mudou completamente. Trabalhar com ópera, opereta e musicais durante minha graduação teve importância singular para definir o músico que sou hoje.
**Quais os principais objetivos da Academia de Ópera Sinos?**
Creio que a Academia de Ópera Sinos tem um papel fundamental na difusão do conhecimento. O maestro André Cardoso tem uma pesquisa sobre a grande quantidade de teatros de ópera no Brasil que são subaproveitados. É necessário que mais pessoas se familiarizem com o gênero – a ópera está intimamente conectada com a sociedade e é importante que músicos tenham acesso a conteúdos que auxiliem na criação e execução desse tipo de repertório. A única maneira de promover tais ações é facilitando esse acesso e desmitificando o tema.
Espero que possamos inspirar profissionais, sobretudo em lugares afastados dos grandes centros, a pensar e produzir ópera. Toda forma de expressão artística precisa estar acessível à população, independentemente de classe social ou localização geográfica. Arte é plural e precisa ser acessível a todos! Vindo de onde eu venho, batalhar e criar mecanismos de acesso à informação tem valor singular para mim.
**Você considera que a Ópera ainda está restrita a um público específico? Como a ópera pode se tornar mais popular?**
José Henrique Moreira, professor da UFRJ, tem uma frase, na minha opinião, excelente – “Todos gostam de ópera… alguns não o sabem ainda”. Creio que existe uma falsa ideia, ou uma ideia ultrapassada, de que a ópera é uma forma de arte reservada às elites e desconectada com a realidade do povo. Não! A ópera é uma forma abrangente e inclusive de expressão artística, historicamente conectada à sociedade. Creio que, concordando com o Prof. José Henrique, precisamos apresentar a ópera para mais pessoas e quebrar o paradigma de que estes espetáculos artísticos são restritos a uma parcela seleta da população. Neste aspecto, a Academia de Ópera Sinos trabalha para difundir conhecimento, criar espetáculos, encomendar novas óperas de compositores brasileiros… em suma, ir ao encontro da população e dos profissionais da música para difusão da prática operística.
**Quais as principais diferenças entre ópera, opereta e musical?**
É importante mencionar que as três formas têm a mesma gênese – o drama musical, ou o teatro musicado. Dadas as diferenças históricas que a ópera, a opereta e o musical têm entre si, alguns pontos são característicos de cada subgênero. Na ópera, o aspecto musical é proeminente – o canto lírico é a forma de expressão dos cantores, acompanhados de música orquestral. Na opereta, que teve seus primórdios na França, vemos uma versão mais cômica ou satírica, uma versão mais leve da ópera, frequentemente misturando diálogos falados e música (algo que também ocorre em ópera).
Já o musical é, de certa maneira, uma forma derivativa da opereta inglesa. Nele, o texto (aspecto teatral) tem grande importância. Atualmente, cantores em musicais utilizam uma técnica diferente do canto lírico para suas apresentações. Musicais podem ser acompanhados por uma orquestra ou por um conjunto diferenciado – em alguns casos até música eletrônica. Eu tenho um vídeo, que será disponibilizado em breve no site do Sinos, falando sobre esse assunto.
**Quais dicas você daria para quem quer entrar para o mundo da ópera? Por onde começar?**
Creio que a melhor maneira de se aproximar do mundo da ópera é pela experiência. Meu conselho é: vá ao teatro assistir uma ópera! Os ingressos são acessíveis. Caso não seja possível o deslocamento até um teatro de ópera, sugiro assistir produções hoje disponíveis em plataformas digitais. O melhor caminho para gostar de ópera é experimentando o gênero! A partir daí, todas as direções são possíveis, mas o começo, a meu ver, é sempre pela paixão, pelo aspecto emocional, que só poder vir a partir da experiência e do contato com o gênero.
**Juliano Dutra Aniceto** é bacharel em música pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (Brasil) e mestre em música pela East Carolina University (EUA). Nos Estados Unidos, foi regente convidado da Baltimore Symphony Orchestra e atua como regente assistente da Peabody Symphony Orchestra. Foi diretor musical da ECU – Opera Theater na posicão de Diretor Musical convidado e regente assistente e convidado da ECU Symphony Orchestra. No Brasil, participou de produções operísticas e musicais, somando 13 títulos. Foi regente assistente da Orquestra Jovem do Estado de São Paulo por dois anos e meio. Participou como regente assistente e preparador do coro em produções operísticas no Theatro São Pedro, em São Paulo e dirigiu concertos com a Orquestra Sinfônica da USP, Orquestra Sinfônica da UFRJ, entre outras.
Em sua formação, teve aulas com Ernani Aguiar (UFRJ), Claudio Cruz, Kurt Masur, Dalia Stasevska, Johannes Schlaefli, Kenneth Kiesler e Isaac Karabtchevsky, entre outros. Nos Estados Unidos, estudou com Jorge Richter e atualmente cursa o Doutorado em Regência pelo Peabody Institute of the Johns Hopkins Universitym sob a orientação de Marin Alsop.
**A Academia de Ópera Sinos**
Coordenada pelo maestro Silvio Viegas, a Academia de Ópera Sinos tem como objetivo introduzir a ópera e seus subgêneros nos projetos sociais que atuam no ensino coletivo dos instrumentos orquestrais, com a formação de orquestras, e junto a instituições que mantenham orquestras jovens.
O projeto envolve a produção de videoaulas, ministradas por profissionais brasileiros da ópera, dentre eles Juliano, contendo conteúdos históricos, musicais, estilísticos, técnicos além de informações sobre produção e gestão. O projeto inclui também a criação e apresentação de quatro novas óperas de câmara, encomendadas pelo projeto aos compositores Tim Rescala, João Guilherme Ripper, André Mehmari e Eli-Eri Moura.
***As videoaulas da Academia de Ópera Sinos podem ser assistidas aqui no site, no link abaixo e, também no canal Arte de Toda Gente, no Youtube.***
https://sinos.art.br/cursos/Academia-de-Opera/Academia-de-Opera
Foto de abertura: Juliano Dutra em foto de divulgação