Em seu projeto de mesmo nome, o coletivo Samboclotec propõe “a criação de partituras corporais inspiradas nas corporeidades e simbologias do Samba de Caboclo, atravessados pelos elementos da natureza para uma leitura contemporânea, poética e tecnológica de vida”. Os autores explicam que, em cada episódio, é relacionada uma energia da natureza a uma composição coreográfica, para disparar possibilidades de configurações estéticas na contemporaneidade. No distanciamento social e em quarentena; dentro de casa, com seus elementos constitutivos, inseridos no fazer cotidiano e naturalidade dos momentos e ações. O coletivo é composto por Inah Irenam, Nei Lima, Bruno de Jesus e Fabrício Rocha.
Inah Irenam informa que, o primeiro vídeo da série, intitulado *Costas Atlântica*, é a “costextualização” do Atlântico Negro, a travessia pela kalunga (o grande mar). “As costas que receberam diversos castigos pelas insubmissões, que carregaram a construção de nações, cidades e estados a sangue; costas que dançam o ijexá das águas; que dançam as danças de guerra, de fartura, de luta e de deleite; costas que são diariamente atingidas por tiros; costas atingidas pelo racismo cotidiano; costas que prospectam futuros leves e caudalosos de esperanças”, diz.
“O samba é uma tecnologia ancestral de resistência e, portanto, capaz de configurar em diversos corpos seus modos de existência e elaboração de gestualidades na contemporaneidade”, afirma a mestranda em Dança.
**A seguir, as sinopses dos demais episódios criados pelo coletivo:**
**A-DÔ**
Na pia de uma cozinha, uma torneira aberta, um ralo e uma faca provocam imagens e gestualidades de um samba riscA-DÔ, marcA-DÔ, sincopA-DÔ, arriscaA-DÔ, cuidA-DÔ. A faca e o prato formam um instrumento utilizado para tirar um samba em uma roda. E não um instrumento vergonhoso ou desqualificA-DÔ. É tecnologia contra colonial.
**Reza**
Através dos cânticos, sambas, orações, palavras energizadas que emanamos nossos desejos ao cosmo, alimentando nossa ancestralidade. No comer juntos nos terreiros de candomblé, a preparação da comida, os cortes dos alimentos são regados de muitas orações e cânticos. A reza é poder de conexão e não existe dádiva sem oração. As folhas que nos alimentam e nutrem. A comida sem agrotóxicos.
**Resposta vermelha cor de terra**
Uma dança de perguntas e respostas na gira de acerolas vermelhas tão quanto as nossas vidas. Mãos que acolhem e lançam futuros na poesia de frutas e frutos de árvores frondosas. O caboclo mandou avisar dos caminhos pisados na terra. O sotaque de que vem das possibilidades infinitas. O que você quer saber?
**Olholavan’água**
Um samba tirado com os pés banhados de águas límpidas no azul infinito do mar. O reflexo da imagem corporal criando ângulos para olhares múltiplos, navegando em outros ares e mares. Um rosto banhado de águas para refrescar e limpar o olhar para ver no abebé (insígnias de Yemoja e Oxum) contemporâneo a beleza única e pessoal, assim como o samba.
**Curafolha**
Em *Curafolha*, a ressignificação do bate folha, limpeza e banho praticados nos terreiros de candomblé é movimentado pela sinuosidade da folha de couve. A leveza e nutrição que sustenta um corpo negro e feminino dançante para a criação de movimentos e gestualidade. Espraiando movimentos para volver práticas que simbolizem nossos lugares de pertencimento.
**Curafolha2**
Uma escuta sensível às folhas a vestir o corpo com a armadura da fartura para galopar nas sinuosidades da vida. Um samba miudinho para abrir caminhos entre as folhas densificando o corpo a derramar poéticas cabocladas na escada azul da varanda de casa. O olhar firme e lúcido de enfrentamento a quebrar estruturas a ideologias euro centradas em narrativas branqueadas.
**Samba no muro**
Caminhar por saberes que edificam um povo e suas práticas, que mesmo com toda a perversidade imposta pela “colonialidade” projetam, lançam, dançam futuros possíveis. Os sambas de caboclo estendendo camadas de pesquisa em ambientes complexos, provocando deslocamentos físicos e estéticos no alto de um muro gradeado.
**Inah Irenam** é intérprete criadora, gestora, curadora e produtora cultural. Técnica em Dança pela Escola de Dança da FUNCEB, possui bacharelado em Artes (UFBA), com concentração em cinema e audiovisual. É graduanda em Museologia pela UFBA e mestranda em Dança pelo PRODAN/UFBA. Idealizadora, Diretora e Curadora do EPA! Encontro Periférico de Artes e da Batalha de Pagode Baiano, é pesquisadora das corporeidades dos Sambas de Caboclo e do Pagode Baiano.
**Veja a apresentação deste e de outros trabalhos da Mostra Realidades em Artes Visuais aqui no site do Bossa Criativa e no canal Arte de Toda Gente, no Youtube.**
Foto de divulgação