Vídeo performance
“A oportunidade criada pelo site bossa criativa, foi uma provocação para que eu e a diretora de fotografia Thais Grechi, colocássemos em prática uma antiga vontade de fazermos um primeiro curta juntos, dividindo e colaborando em todas as funções”, conta o ator, produtor e diretor teatral Julio Adrião. Ele explica que o vídeo produzido, que batizaram de Qual a razão de tudo isso, eu sempre penso, é um exercício/reflexão sobre a memória e a eternidade.
“Ele foi desenvolvido a partir de um texto escrito por mim, em 1986”, prossegue Julio. Nesse texto, ele incluiu fragmentos de *Utopia*, de Thomas More, de La libertà, de Giorgio Gaber, e de O enteado, de Juan José Saer.
“A ideia se materializou num plano mosaico sequência, editado com imagens dos ensaios e do dia da gravação oficial que, misturadas e repetidas, revelaram em sua estética a reflexão sobre a memória, a perenidade, o improviso e a finitude, que eram originalmente os assuntos que o roteiro abordava, por meio dos textos escolhidos”.
O resultado, segundo o cineasta e amigo do ator, Angel Diez, que assistiu a uma das primeiras versões editadas do trabalho, “transita num tempo que parece futuro, vira passado e fica presente, por meio de uma câmera invasiva, porém amiga”.
O Ator no Solo Narrativo
A partir da experiência, prática e reflexões de mais de 15 anos sobre o processo que envolveu a criação e preparação do espetáculo A Descoberta das Américas, o ator e diretor Júlio Adrião criou a oficina O Ator no Solo Narrativo. Disponíveis aqui no site do Bossa Criativa, os vídeos tratam da introdução à metodologia para o desenvolvimento de narrativas. A peça que inspirou a oficina conta a história de Johan Padan, um cidadão sem importância na sociedade espanhola no final do século XV e que, em 1492, foge da fogueira da Inquisição embarcando em uma das caravelas de Cristóvão Colombo rumo às Américas e vivencia aventuras em sua chegada à terra desconhecida. O monólogo usa o mínimo de recursos cênicos, tendo como foco a energia, a dinâmica da atuação e o contato direto com o público.
“O Ator no Solo Narrativo é uma oficina que eu venho desenvolvendo nos últimos anos em cima da ideia do ator autor do seu próprio trabalho, na linha de um solo”, diz Julio Adrião. “Aqui o solo é mais especificamente desenvolvido tendo a ação física como elemento narrador concreto”, explica. Ele explica que o ator vai desenvolver o seu trabalho a partir de uma metodologia em que ele vai considerar questões que serão discutidas/trabalhadas ao longo dos módulos. “Mais do que o ator que construir o personagem, são os personagens que constroem o ator. Porque o ator é sempre aquele e são os personagens que vão permitir que todas as possibilidades de comunicação desse ator sejam ativadas para que aquilo aconteça. É por meio dos personagens, portanto, que esse ator se concretiza”.
Para essa oficina, Júlio estabeleceu um tripé para as ações que serão desenvolvidas: físicas, sonoras e textuais, com predominância de umas ou outras em tempos distintos. O roteiro completo você confere mais abaixo.
Ator, produtor e diretor teatral, Julio nasceu no Rio de Janeiro, em 1960. Ele se formou pela Casa das Artes de Laranjeiras (CAL), em 1986, e viajou para a Itália, onde ficou trabalhando por seis anos com o Teatro Potlach e outras companhias. Integrou a Cia de Público, onde atuou até 2002. Em 2005, com o solo narrativo A descoberta das Américas, de Dario Fo, ganhou o Prêmio Shell/RJ de melhor ator. Em 2007, participou da minissérie Amazônia, de Galvez a Chico Mendes, de Gloria Perez, exibida na Rede Globo. Sua estreia no cinema foi com o filme Verônica (2009), de Maurício Farias.
Confira a seguir uma entrevista com Julio Adrião.
Como você viu o impacto da pandemia para o seu trabalho? Tem descoberto novas alternativas?
No momento em que tudo parou, estávamos iniciando uma série de apresentações pelos 15 anos do espetáculo A descoberta das Américas. Como todos, tivemos que encurtar o momento do choque, para objetivar a vida. Chegamos a fazer uma apresentação remota em junho, e venho participando e produzindo várias ações nesse formato, tendo inclusive passado a ser bastante propositivo. A grande questão é ainda econômica, pois, apesar de muito trabalho sendo produzido, o dinheiro gerado não chega nem perto do que estávamos acostumados a gerar.
O que você considera essencial na preparação do ator?
Foco, disciplina e boas companhias. As ideias e vontades são fruto disso.
Recentemente, você começou a disponibilizar para o público todo o material do espetáculo A Descoberta das Américas, coletado ao longo de mais de uma década. O que você destaca no material compartilhado?
É um material muito rico, variado e extenso. Portanto, compartilhar esse acervo é como tirar uma responsabilidade dos ombros, pois, me considero apenas um fiel guardião desse trabalho, que mudou radicalmente a minha trajetória. E não faria o menor sentido ter esse material parado, sem que o verdadeiro dono, o público, pudesse desfrutar dele, para seus interesses. Temos ainda muita coisa a disponibilizar, e espero conseguir fazer isso ao longo dos próximos tempos. Isso embora me dê conta de que restará sempre muito a ser feito, pois, além das imagens, há muitas passagens e relatos e, por mais que eu tente escrever nas descrições de cada vídeo, percebo que é uma missão improvável de ser totalmente concluída.
Você desenvolve o trabalho *Solo Narrativo* há vários anos. Quais são os objetivos e como é a oficina dessa nova metodologia para o desenvolvimento de narrativas que está sendo apresentada aqui no Projeto Bossa Criativa?
É importante deixar claro que não há nada de realmente novo, apenas um olhar muito próprio, diante de um assunto que tive que aprender muito, por meio da prática, e que gerou grande interesse por parte de um público específico. O desenvolvimento da oficina foi, portanto, uma oportunidade de refletir sobre o que havíamos feito em sala, no processo de construção de nosso trabalho, e tentar organizar essas observações de forma metodológica, para poder ser passado adiante. Continuo acreditando que quem mais aprende ao longo das oficinas sou eu mesmo, pois, trabalho a partir do material de cada ator, e ter contato com isso é uma riqueza incalculável.
Roteiro da oficina:
Módulo 01
Sala de trabalho / o espectador privilegiado
Módulo 02
Fluxo narrativo / metodologia / código
Módulo 03
Personagem / detalhe / foco
Módulo 04
Códigos / ambiente
Módulo 05
O amadurecimento da cena / considerações finais
Os primeiros vídeos da oficina de Júlio Adrião já podem ser conferidos aqui no site do Bossa Criativa, acompanhe o lançamento dos próximos.
Foto: Maria Elisa Franco – Divulgação