Ensinando choro aos japoneses

Presente como professor em dois módulos da série Casa do Choro – Princípios do Choro e Furiosa Portátil –, Paulo Aragão é um dos diretores da instituição de mesmo nome e, nesta entrevista, fala sobre a série em parceria com o Bossa Criativa e conta como suas atividades foram – e continuam sendo – adaptadas para o período de distanciamento social.

Como surgiu a ideia da parceria com o projeto Bossa Criativa para a série Casa do Choro?

Ao longo desses muitos anos de existência do Instituto Casa do Choro, nós já tivemos parcerias importantes com a Funarte. E com a Escola de Música da UFRJ, sempre houve um desejo de aproximação, a intenção de unir esforços em torno da música brasileira. Algo que para mim, particularmente, como ex-aluno da EM, era muito caro. O convite dessas duas instituições, através do professor Marcelo Jardim, veio, portanto, a calhar. Como temos um grupo bastante grande de professores e colaboradores na Casa do Choro, ficou decidido que faríamos uma série. Nela desenvolvemos várias oficinas diferentes, abordando aspectos históricos do choro – relacionados ao trabalho de pesquisa desenvolvido há anos na Casa – e aspectos práticos – relacionados ao nosso trabalho de ensino na Escola Portátil de Música, que agora está completando 20 anos de existência.

Durante a pandemia, a Casa do Choro e a Escola Portátil tiveram que se reinventar. O Bandão, por exemplo, que era um dos pontos altos da oficina na Urca, virou virtual. Como foi esse processo?

Foi um grande desafio e, na verdade, é um desafio ainda em curso. Tivemos que reinventar a forma e a metodologia, que sempre dependeram da sincronia entre os músicos, já que nossas aulas são essencialmente coletivas. A grande vantagem das aulas virtuais, porém, é que conseguimos alcançar pessoas do mundo inteiro. E há um interesse muito grande por parte de músicos de todos os lugares no choro. Músicos oriundos do jazz, da música clássica. Tivemos um número recorde de matriculados, cerca de 1.200 alunos! Só de japoneses, tivemos mais de 60 alunos. O Bandão, um grande ensaio coletivo que mistura alunos iniciantes, intermediários e avançados, é em essência uma atividade insubstituível. Mas podemos nos orgulhar de termos alcançado resultados incríveis nos Bandões Virtuais, graças à dedicação dos alunos e professores. Foram seis vídeos produzidos ao longo do ano passado, o último deles com mais de 400 pessoas participando. Gente de todas as idades, de todos os países. Momento emocionante para nós.

Como você avalia a importância da música e das demais artes nessa pandemia?

Para nós, artistas, a manutenção do contato com o público através das novas possibilidades virtuais foi o alimento que conduziu nossa esperança. As limitações e as dificuldades foram compensadas por um afeto diferente por parte do público, Apesar de tudo, sentimos a importância do nosso trabalho, a importância da arte e da música em particular, na vida das pessoas. De certa forma foi isso que nos salvou nesse ano tão difícil. E por isso a importância fundamental de projetos como o Bossa Criativa.

Qual a importância do choro na Música brasileira?

O choro é um tesouro ainda um pouco escondido na música brasileira. A gente sente que ele está na base de tudo o que se faz em nossa música. É um gênero muito rico, que conserva o trabalho de gerações e gerações de músicos, desde o século XIX, e que continua sendo renovado diariamente, mais de 150 anos depois. Com muita vitalidade, segue encantando jovens músicos e novas plateias no Brasil e no mundo.

E como a Música entrou na sua vida?

Não tenho músicos em minha família, mas a música me abraçou já na infância, de tal forma que não houve outro caminho na minha vida que não levasse à música. Sou um ex-aluno muito orgulhoso da Escola de Música da UFRJ! Me formei em 1994.

Paulo Aragão é um dos mais destacados arranjadores brasileiros de sua geração, tendo trabalhado ao lado de nomes como Guinga, Mauricio Carrilho, Nailor Proveta e Monica Salmaso; e tendo colaborado com artistas como Sergio Assad, Yamandu Costa e Hamilton de Holanda. Já teve composições e arranjos tocados por orquestras como Los Angeles Philharmonic Orchestra, Orchestre National de France, Gewandhaus Orchestra de Leipzig, Metropole Orkest (Holanda), Orquestra Sinfônica Brasileira (OSB), Orquestra Petrobras Sinfônica (OPeS), Orquestra Jazz Sinfônica (SP), entre outras. É integrante e fundador do Quarteto Maogani de Violões, com o qual já ganhou os prêmios TIM, Caras, Rival BR e mais recentemente o 26º Prêmio da Música Brasileira, como melhor grupo instrumental. É professor da Escola Portátil de Música e um dos diretores da Casa do Choro, no Rio de Janeiro.

Na série Casa do Choro, Paulo Aragão ministra, junto com Jayme Vignoli, Luciana Rabello e Pedro Aragão, a oficina Princípios do Choro. “Nesse módulo, um assunto abordado será o processo de formação do choro desde o século XIX a partir dos seus subgêneros”, explica.

A série é composta de 24 videoaulas, dividida em dois módulos (Gêneros do choro e Personagens do Choro) sobre as últimas décadas do séc. XIX e o início do séc. XX. Todas as aulas são ilustradas com uma gravação relacionada ao tema e sua respectiva partitura.

Paulo também está presente no módulo Furiosa Portátil, composto por 14 vídeos, nos quais compositores ligados à Casa do Choro – alguns deles entre os mais atuantes no cenário popular brasileiro – analisam peças que criaram para a Orquestra Furiosa Portátil, formada por alunos e professores da Escola Portátil de Música; e gravadas em CD, em 2014. Todas essas oficinas contêm gravações sincronizadas às partituras das músicas analisadas. O trabalho é de Cristóvão Bastos, Mauricio Carrilho, Bia Paes Leme, Luciana Rabello, Marcílio Lopes, Jayme Vignoli, Paulo Aragão e Pedro Paes.

Assista os vídeos da Série Casa do Choro aqui no site do Bossa Criativa e no canal Arte de Toda Gente no Youtube.