*Com uma chamada que esteve aberta até o dia 8 de agosto, o projeto Acessibilifolia vai selecionar e implementar a acessibilização de conteúdos audiovisuais de grupos envolvidos na promoção de festas populares. Nesta entrevista, o músico e professor André Ramos, um dos organizadores e curadores do projeto, nos fala sobre a importância de ampliar o acesso desse conteúdo artístico e cultural para o público com deficiência.
**Qual a importância da acessibilização dos vídeos das festas populares que o Acessibilifolia está promovendo?*
O trabalho de acessibilização do material audiovisual dos grupos artísticos é essencial no momento que vivemos. Devido ao isolamento social, as atividades presenciais dos grupos foram canceladas, e vídeos como lives, clipes e minidocumentários têm sido a principal forma de troca com o público.
Tornar a comunicação dos grupos artísticos acessível para pessoas com deficiência é abrir um canal de diálogo que pode preparar o terreno para uma futura volta às atividades nas ruas mais inclusiva e democrática. Esse edital pretende incentivar os grupos a buscar a acessibilidade em suas ações como um todo. Além disso, pretende também dar meios para que os grupos que estejam engajados em tornar seus vídeos acessíveis possam fazê-lo sem precisar arcar com os custos.
**Além da acessibilização de produtos online, como vídeos, a chamada também visa descobrir outras iniciativas já existentes. Por exemplo, a Camila Alves, que desfilou na primeira ala acessível da Orquestra Voadora e tem deficiência visual, falou em entrevista ao Um Novo Olhar da “sensação de pertencimento” e enfatizou que “a acessibilidade é a oportunidade de construção de um mundo partilhado, mais diverso”. Como você viu o resultado dessas ações no grupo como um todo e seu impacto para as pessoas com deficiência?**
Um dos objetivos do edital é incentivar a produção de minidocumentários sobre grupos artísticos inclusivos. Há trabalhos seríssimos sendo feitos que podem trazer reflexões importantíssimas para outros coletivos em todo o Brasil.
Na Orquestra Voadora como um todo o impacto do núcleo de acessibilidade que formamos tem sido imenso. A contribuição que a Camila Alves nos deu durante o processo de preparação do desfile e com todas as reflexões que trouxe em seu depoimento são inestimáveis. No livro que lançou recentemente, *E Se Experimentássemos Mais? Contribuições Não Técnicas De Acessibilidade Em Espaços Culturais*, Camila propõe uma abordagem muito potente sobre o tema da acessibilidade, dos espaços e da própria Arte. Acredito que tomar contato com essa concepção de um mundo mais partilhado e diverso tenha um enorme potencial transformador para qualquer coletivo.
**Alguns projetos culturais já desenvolvem trabalhos importantes de acessibilidade, gostaria de destacar algum exemplo?**
Um grupo que sempre foi muito importante para a Orquestra Voadora é a Pulsar Companhia de Dança. A companhia é formada por bailarinos com e sem deficiência e desenvolve um trabalho que transcende as diferenças, focando nas possibilidades de cada intérprete. A Andreia Chiesorin Nunes, que atua na Pulsar, participa do núcleo de acessibilidade da Orquestra Voadora e é uma grande amiga e parceira nossa, desde os primeiros desfiles que fizemos. Ela é sem dúvida uma grande referência para todos nós no pensamento sobre acessibilidade.
Gostaria de destacar também um trabalho incrível que conheci recentemente, chamado Banda Pif da Inclusão. O grupo foi fundado pela Associação de Pessoas com Deficiência de Caruaru (Apodec). Eles fazem um som de uma qualidade artística enorme, que representa as raízes musicais tão ricas que o Brasil tem. Vale muito a pena conhecer.
**Você considera que os produtos culturais acessibilizados, além de ampliarem a experiência das pessoas com deficiência como público, estimulam também novos talentos artísticos e inclusive o trabalho como mediadores culturais?**
Sim, penso que acessibilizar os produtos culturais seja parte de um debate maior a respeito da inclusão das pessoas com deficiência em toda a sociedade. Esse debate é muito bem-vindo no contexto da folia, que tem como preceito ser uma manifestação cultural democrática. A folia desempenha um importante papel na trajetória de artistas, técnicos, mediadores culturais entre muitos outros profissionais. É preciso que as diferentes formas de participação na folia sejam acessíveis a todos.
**Que dica você daria para produtores e grupos que querem acessibilizar seus projetos, mas não sabem como começar?**
O conselho que eu daria seria buscar o diálogo e a participação de pessoas com deficiência o mais cedo possível dentro da concepção de seus projetos. Só com essa representatividade o grupo vai poder caminhar para a inclusão de fato. São as pessoas com deficiência que podem trazer as questões que lhes são importantes para o grupo.
**André Ramos** é carioca, saxofonista, arranjador e compositor. Formou-se professor de Música em 2007 pela Unirio e, atualmente cursa o mestrado profissional em Pedagogia do Instrumento no Promus UFRJ. É saxofonista barítono da Orquestra Voadora desde a sua fundação e faz arranjos e músicas autorais para a banda. Desde 2013, dá aulas de saxofone e participa da organização da oficina da Orquestra Voadora. Participou em 2020 da formação do núcleo de acessibilidade do bloco da Orquestra. Produziu o álbum *Ferro Velho*, e os singles *Technocirco*, *Revoar* e *Pernas Voadoras*.
**Sobre a chamada:**
Os vídeos selecionados serão acessibilizados pela equipe do projeto Um Novo Olhar, ganhando legendagem para surdos e ensurdecidos, interpretação em Libras e audiodescrição, sendo depois publicados no site e nas redes sociais do Um Novo Olhar e no canal Arte de Toda Gente. O projeto é uma parceria da Fundação Nacional de Artes – Funarte com a Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ e as inscrições para a chamada podem ser feitas por meio de um formulário disponível aqui no site, onde também está disponível o edital completo (veja na “home” do site, rolando a página para baixo).
A categoria Iniciativas Inclusivas é destinada a grupos que já desenvolvem ações no campo da acessibilidade e que contam com a presença de pessoas com deficiência no planejamento e na realização de suas atividades. Para esta categoria, serão selecionados vídeos que relatem a experiência vivida pelos grupos como forma de estimular outros a desenvolverem ações acessíveis.
O vídeo apresentado no ato da inscrição não precisa ser o material finalizado, basta explicar o material audiovisual que se pretende desenvolver.
Já a categoria Acessibilização de Material Audiovisual é destinada a qualquer grupo de festejos populares que já possua registro audiovisual de suas atividades
No início do ano as atividades do Acessibilifolia tiveram como foco o carnaval de rua da cidade do Rio de Janeiro, fomentando a participação de pessoas com deficiência nas diversas etapas e funções que esta folia apresenta.
Confira no link informações sobre como foi a primeira fase, que contou com a participação da Orquestra Voadora: https://umnovoolhar.art.br/noticias/Acessibilifolia-a-festa-inclusiva. Você pode assistir aos vídeos dessa etapa aqui no site e no canal Arte de Toda Gente no Youtube.
Nesta nova etapa, o programa amplia sua área de atuação para outras manifestações festivas, como desfiles de maracatu, blocos de frevo, bumba-meu-boi e muito mais.
*Foto da abertura: Munique Otto*